O comércio internacional e o meio ambiente estão fortemente conectados, visto que o comércio internacional geralmente induz maior exploração dos recursos ambientais dos países, com o intuito de aumentar a produção. Adicionalmente, a Organização Mundial do Comércio (OMC) tem um papel importante em difundir políticas ambientais entre seus membros. Esse é o caso, por exemplo, da OMC definindo se uma regra ambiental no comércio internacional, implementada unilateralmente, configura protecionismo verde. O protecionismo verde pode ser definido como um conjunto de medidas não-tarifárias implementadas por um país no comércio realizado com outro(s) país(es) e essa implementação é feita a despeito das recomendações e regras da OMC. Quando uma regra ambiental é implementada no comércio internacional e ela não viola regras da OMC, essa situação não configuraria protecionismo verde.
Mas por que o protecionismo verde tem esse nome? O verde diz respeito ao meio ambiente, enquanto o protecionismo diz respeito a uma prática que pode criar reserva de mercado para o país que implementa esses critérios mais “rígidos” nas suas trocas comerciais. Como há certa arbitrariedade no que os países podem considerar como algo não-desejável no comércio internacional (em termos ambientais), na prática, requerimentos ambientais no comércio internacional podem, a depender do país, implicar numa espécie de difusor de políticas ambientais domésticas.
Um caso bastante emblemático de requerimentos ambientais no comércio internacional diz respeito às restrições que os Estados Unidos colocaram sobre seus parceiros comerciais que produziam tuna na década de 1990. O método de pesca com tuna consistia numa forma que implicava na morte de golfinhos. Dessa forma, os Estados Unidos criaram uma regra de que a tuna importada usando esses métodos deletérios à vida de golfinhos estava banida na produção interna e na tuna importada, direta ou indiretamente dos países que não satisfaziam essa regra. Dado que isso ocorreu de forma anterior à criação da OMC e na existência do GATT apenas, o fórum de disputas do GATT reconheceu que os Estados Unidos foram desleais no estabelecimento dessa regra de importação de tuna. Isso, portanto, configurou protecionismo verde.
O comércio internacional se assenta sobre duas regras básicas: não-discriminação entre bens produzidos nacionalmente e importados; e a as nações devem ser tratadas de formas semelhantes no comércio internacional por um certo país. O primeiro princípio não impede que bens importados sejam taxados ou sujeitos a tarifas; ele simplesmente garante que assim que o bem importado adentrar o mercado nacional, ele não pode sofrer sanções ulteriores ou outras medidas que o tornem menos competitivo frente ao bem produzido nacionalmente. O segundo princípio, também conhecido como nação mais favorecida ou most-favoured nation (MFN) principle, indica que um país deve tratar seus parceiros comerciais de forma semelhante, ou seja, caso os Estados Unidos coloquem uma tarifa mais baixa sobre o trigo importado da Ucrânia, essa tarifa também deve ser estendida às importações americanas de trigo de outros países, isto é, o trigo argentino deveria ser taxado da mesma forma que o trigo ucraniano. Dessa forma, a OMC se assenta sobre princípios liberalizantes do comércio internacional, considerando que o comércio entre países tende a ser benéfico a todos e medidas de fechamento da economia são geralmente vistas de forma negativa pelo órgão. Adicionalmente, essas medidas não são apenas vistas de forma negativa pela organização como também ela tende a decidir negativamente por essas medidas de fechamento do comércio internacional. Uma exceção bastante natural a esses princípios consiste nos acordos de comércio nos quais tarifas e taxas podem ser colocadas em patamares mais baixos daqueles praticados por um país e outros parceiros comerciais. Isso se encontra previsto e detalhado no artigo XXIV do GATT, disponível aqui.
Em que medida o comércio internacional pode ser um difusor de política ambiental, dadas as possíveis acusações de protecionismo verde? Estabelecimentos unilaterais de política ambiental tendem a produzir resultados mais passíveis do rótulo de protecionismo verde do que temas ambientais definidos por acordos comerciais. Na verdade, cerca de 85% dos acordos comerciais já possuem provisões ambientais (JINNAH e MORIN, 2020) e podem se tratar, portanto, de um meio mais efetivo para difusão de políticas ambientais razoáveis no que diz respeito ao comércio internacional.
Um outro ponto relevante na questão OMC e política ambiental diz respeito ao possível descasamento de comércio internacional e as medidas previstas por acordos ambientais. Caso dois países se encontrem num imbróglio relacionado à política ambiental de um deles no que concerne ao comércio internacional, então um acordo ambiental relacionado a essa temática é um fórum adequado para a resolução desse problema, considerando que ambos os países sejam signatários desse acordo ambiental. Por outro lado, caso apenas um dos países seja signatário desse acordo ambiental e o assunto em contenção seja diretamente relacionado ao comércio internacional, então a OMC é um fórum apropriado para definir e possivelmente resolver esse problema.
Ademais, uma discussão da discricionariedade no estabelecimento de sua própria política ambiental é de ordem. Por exemplo, caso algum parceiro comercial de monta estabeleça regras mais rígidas no que concerne à produção de bens para comércio internacional, é possível que ele possua grande poder sobre a política ambiental de outros países. Isso pode ser bastante contraproducente em termos de preservação e conservação ambiental na medida em que o próprio país é possivelmente o agente mais capaz em definir uma boa política ambiental para si. Por outro lado, enquanto sua reclamação frente à OMC, relacionada ao possível protecionismo verde, não é resolvida, tem-se que o país, caso queira continuar exportando para o país com política ambiental comercial mais restritiva, deve se adequar a uma política ambiental externa.
O comércio internacional e meio ambiente são temas profundamente relacionados, visto que o primeiro geralmente implica em uma maior produção às custas de florestas e outros recursos ambientais. A difusão de política ambiental via acordos comerciais e outros tipos de comércio internacional é relevante na medida em que boas práticas ambientais podem ser transmitidas via comércio internacional. Ao mesmo tempo, essa difusão de políticas ambientais não ocorre de forma isolada das possíveis acusações de protecionismo verde e acordos ambientais, assim como a própria OMC oferece fóruns válidos para dirimir quaisquer contenções relacionadas ao comércio internacional e questões ambientais.